sábado, 31 de dezembro de 2016

A forma de rompimento do CP é importante?


O ensaio de resistência à compressão, usando cilindros parece bastante simples, à primeira vista. Carrega-se um corpo de prova cilíndrico até que ele se rompa e divide-se a carga de ruptura pela área em que a carga foi aplicada, ou seja, a sessão transversa do corpo de prova. Mas pouca gente se atenta para o fato de que existem importantes particularidades sobre este ensaio que não são totalmente intuitivas.
Por exemplo, é difícil intuir que a resistência que o concreto apresenta no corpo de prova rompido não é a mesma que ele apresenta na estrutura. Afinal, lá no pilar as condições são muito diferentes, a relação de altura é outra, o tipo de carregamento é outro, a maneira como o concreto foi adensado é outra, etc. O corpo de prova, na verdade, oferece uma convenção para análise da qualidade do concreto como um produto, não uma análise da qualidade da estrutura de concreto. Outro exemplo, a carga com que um corpo de prova se rompe dependerá da deformação que esta carga causa no concreto. Normalmente, um corpo de prova se rompe quando a deformação específica chega a 3 por mil. Ou seja, o módulo de deformação do concreto, tem um papel tão ou mais importante que a sua resistência à compressão em si, na dinâmica do teste.
Mas o tema deste texto é outra estranha propriedade do teste de compressão, ou pelo menos pode parecer estranha até que se dedique um pouco de reflexão ao fato. É que o corpo de prova cilíndrico, quando colocado na máquina de ensaio, apesar de ser carregado à compressão axial, se rompe por cisalhamento. A força cortante chega a um nível crítico (à medida que o corpo de prova se deforma), antes que a falha por compressão simples dos componentes do concreto ocorra. Esta informação, que parece trivial, é um importante fundamento quando se analisa a maneira como o corpo de prova rompeu, durante o ensaio. E a análise da forma como o corpo de prova rompe, pode evitar que se tomem importantes decisões com dados contaminados ou enganosos.
As fotos abaixo mostram uma série de 4 corpos de prova cilíndricos rompidos, de formato 5 x 10 cm, usados para ilustrar a apresentação aproximada dos diferentes tipos de ruptura e sua influência no resultado:
 

Esta é a ruptura ideal de um corpo de prova cilíndrico, com forma de ampulheta, onde as camadas laterais externas se desprendem. Aqui, a força foi tão bem distribuída ao longo da superfície de contato com a prensa que, os planos de cisalhamento seguiram a direção definida pela deformação tipo “barril”, aquela que condiciona o Coeficiente de Poisson. Os resultados de CPs assim, tem máxima confiabilidade em relação ao teste de compressão, especificamente.

 

Ruptura cisalhada lateral. Este é o segundo tipo de ruptura mais confiável. O cisalhamento ocorre sempre em planos inclinados em relação à direção da força cortante que o gera, por isso a linha de fratura atravessando na diagonal do CP. Um teste que resulte em um efeito assim sobre o corpo de prova pode ser considerado normal e aceitável.
 

Rupturas colunares, como as demonstradas na foto acima, são mais raras. Elas indicam que pode estar havendo uma pequena influência da preparação de topo do corpo de prova, no resultado. Rupturas assim, devem motivar avaliações na qualidade de retificadoras e capeadores, bem como do processo de teste em si. Mas eu não descartaria um resultado por este tipo de fratura, apenas o colocaria sob suspeita, carecendo de uma confirmação, caso aponte para uma situação limítrofe ou desfavorável.
 

Ruptura de topo ou de pé. Corpos de prova assim demonstram, claramente, que a aplicação de carga foi muito irregular ou que a extremidade do corpo de prova apresenta alguma falha em sua constituição. A maioria dos casos é por defeito de retificação, ou moldagem excessivamente desnivelada, não corrigida pelo processo de capeamento. Mas também pode ocorrer quando a amostra de concreto usada para a moldagem apresentava segregação ou exsudação excessiva. Isso teria enfraquecido o topo do CP, motivando a ruptura irregular e o comprometimento do resultado. Corpos de prova rompidos desta maneira, não devem ser considerados, a menos que seu resultado possa ser posto em um contexto com outros oriundos de rupturas melhores.
Como já foi dito antes por aqui, quando o assunto é concreto, pior que ter um problema é achar que tem um problema, quando não tem. Analisar os planos de fratura dos corpos de prova podem evitar muitos mal-entendidos e fornecer um sono de muito melhor qualidade para o responsável pela obra.
 
Um forte abraço e até o próximo texto!

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terça-feira, 28 de junho de 2016

Um problema resolvido vale mais que uma venda

 

Um dia, fazem já uns bons anos, alguém clonou meu cartão de banco. O criminoso limpou minha conta e usou todo o limite de crédito. Simplesmente não consegui sacar dinheiro num caixa eletrônico. Imediatamente fui até minha agência e contei o caso para a gerente, que me orientou a fazer uma carta de próprio punho, discriminando as operações que eu não reconhecia. Caramba, era uma sexta feira. No fim de semana, todos os meus amigos eram unânimes:
 
- Se prepara para demorar muito!
- Aconteceu comigo e eu levei meses para conseguir resolver...
- Se eu fosse você abria um BO e procurava um advogado.
 
Finalmente chegou a segunda feira e voltei à agência, já disposto a brigar com quem fosse preciso:
 
- Vim saber qual o prazo para resolução do problema que relatei na sexta feira!!!
- O dinheiro já está disponível na conta, senhor. Pode efetuar saques com tua carteira de identidade, até que teu cartão chegue em 5 dias úteis.
- Há! ... bem... ok! Muito brigado!
 
Nunca mais passou pela minha cabeça trocar de banco. Nem passará. A confiança que tiveram na minha palavra e a velocidade na solução daquele problema ganhou minha fidelidade. O que isso tem a ver com nossos assuntos sobre concreto? Tudo. Nosso mercado é, dentro da construção civil, um dos que mais sofrem da crise de confiança. Não são tão incomuns quanto deveriam, os clientes que duvidam que o caminhão vai chegar na hora, que o produto vai atingir a resistência, que o volume dentro do caminhão está correto, etc. E, principalmente, entram em pânico quando acontece uma falha, partindo do pressuposto que a prestadora de serviços irá se omitir ou tentar engana-lo.
 
 
 
E problemas acontecem. Desde a entrada da matéria prima até o momento em que o caminhão betoneira deixa a obra, existem um número enorme de variáveis, boa parte delas sujeitas a intervenções humanas, dispositivos sensíveis, processos logísticos, clima, toda a sorte de etapas que dependem de um controle rigoroso da qualidade do processo. Todo o processo desta natureza, por mais controlado, eventualmente apresentará uma falha, não importam quantas horas de treinamento foram dispendidas, quantas medidas são feitas pelos fiscais, quantas vezes as maquinas foram calibradas. Uma vez ou outra, teremos um problema. E um problema técnico nunca é mais do que isso: Apenas um problema. E como todo problema, precisa de uma avaliação de causas, a definição de um tratamento do que está não conforme e a implementação de ações corretivas, que visem evitar recorrências. É preciso calma, serenidade e seriedade. E acima de tudo: Transparência.
 
Recentemente, lá na companhia, tivemos um problema com uma das cargas de produto. Tudo aponta para uma falha no processo de medição por fluxo, de um dos insumos. Como sempre, mandamos um técnico para a avaliação preliminar e, logo em seguida, meu amigo e colega Adriano Antunes e eu marcamos uma visita com os representantes máximos de nosso cliente, por sinal pai e filho, que administram o negócio e a obra. Tensão, semblantes fechados e mãos nervosas. As primeiras palavras do cliente foram em tom imperativo e, ao mesmo tempo, inquisidor. Porém, quando começamos a expor os resultados dos testes e propomos, de antemão, um conjunto de ações para solucionar o problema, nem por um instante nos eximindo de culpa ou sugerindo qualquer dificuldade, foi escandalosamente visível a mudança no rosto das pessoas. Agora um sorriso misturado com surpresa:
 
- Fiquei muito feliz com a transparência e profissionalismo de vocês. Eu já estava em vias de contratar um consultor, para preparar um laudo, no caso de vocês tentarem “pular fora”.
 
No entanto, fomos nós que contratamos o consultor, como parte do plano de ações corretivas, no caso o competentíssimo Jonhson Rigueira. O Jonhson, após receber todos os resultados de testes, foi conversar com o cliente antes de falar conosco, uma maneira deliberada de demonstrar que a consultoria não era uma tentativa de estabelecer defesa, mas de buscar uma solução. O resultado: Antes de terminar o processo de avaliação da patologia que estamos tentando solucionar, já fizemos uma venda, na mesma obra, de um produto de alto valor agregado, de vanguarda na tecnologia da empresa e totalmente novo no mercado. O cliente comprou porque estabeleceu uma relação de confiança conosco. Ele sabe que uma empresa que age da maneira que agimos não tem a menor intenção de errar, já que arca com seus erros.
 
Vejamos estas estatísticas, extraídas do blog neoassist.com:
76% dos consumidores dizem que enxergam o atendimento ao cliente como o verdadeiro teste do quanto as empresas os valorizam. (2015 Aspect Consumer Experience Survey)
47% dos consumidores dizem que respostas rápidas para uma solicitação ou reclamação é o elemento chave para a ideia de experiência do cliente. (Economist Intelligence Unit Creating a Seamless Customer Experience Report)
62% dos consumidores globais pararam de fazer negócio com uma marca ou empresa por conta de uma experiência ruim de atendimento. (2015 Global State of Multichannel Customer Service Report)

 
Estes percentuais são impressionantemente altos. Indicam que o relacionamento de confiança vale mais que a qualidade do produto ou o preço. Portanto, meus caros, uma reclamação do cliente é uma oportunidade. Vale mais que uma venda!
 
P.S.:
Estou muito feliz por poder voltar a escrever aqui. Nestes dois anos que fiquei longe do blog, mudei de rumos na companhia, fiquei “grávido” e ganhei um filho adorável (vide a foto abaixo), mas que tem drenado bastante do tempo que, outrora, destinava a escrever. Já estou preparando mais um conteúdo técnico e, prometo (se ainda tenho credibilidade, rs) estará aqui em breve.
 

 
Forte abraço!

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